"Obrigas-me fazer de uma Obra antiga uma nova... da parte de quem deve por todos ser julgado, julgar ele mesmo os outros, querer mudar a língua de um velho e conduzir à infância o mundo já envelhecido.
Qual, de fato, o douto e mesmo o indouto que, desde que tiver nas mãos um exemplar, depois de o haver percorrido apenas uma vez, vendo que se acha em desacordo com o que está habituado a ler, não se ponha imediatamente a clamar que eu sou um sacrílego, um falsário, porque terei tido a audácia de acrescentar, substituir, corrigir alguma coisa nos antigos livros? (Meclamitans esse sacrilegum qui audeam aliquid in verteribus libris addere, mutare, corrigere). Um duplo motivo me consola desta acusação.
O primeiro é que vós, que sois o soberano pontífice, me ordenais que o faça; o segundo é que a verdade não poderia existir em coisas que divergem, mesmo quando tivessem elas por si a aprovação dos maus". (Obras de São Jerônimo, edição dos Beneditinos, 1693, t. It. Col. 1425).
São Jerônimo, “o pai da Bíblia latina” (a vulgata²), chamado de santo padroeiro
dos tradutores, não recebeu o ilustre título por ter sido o primeiro, nos registros
históricos, a apresentar uma teoria da tradução, pois cabe a Platão tal honra. Seja talvez
porque Jerônimo foi o primeiro a reclamar das traduções e da sua qualidade, a criticar
copistas descuidados e a promover uma campanha em prol de maior exatidão. No
entanto, esse mesmo Jerônimo, em sua epístola ‘Os princípios da tradução’, afirma que,
com exceção das Escrituras Sagradas, “um tradutor não devia sentir-se obrigado a
produzir uma transcrição palavra por palavra; bastava traduzir o significado” (p. 437-
438).
Afirmações como essa e como a seguinte, promovem críticas à vulgata e à
Jerônimo, de que o mesmo teria adulterado o seu conteúdo na tradução do texto grego
para o latino.
Consoante às afirmações de Jerônimo, vemos que traduzir é mais do que
conhecer uma língua e seu vocabulário, ou, ainda, é mais do que transpor palavras de
uma língua à outra; traduzir é uma tarefa que requer reflexão consciente, mas é também
uma arte, um dom.
Em oposição, uma outra concepção, de que a tradução acontece num vácuo
temporal e cultural, onde uma ideia formulada numa língua pode ser automaticamente
transposta à outra língua como se tratasse de uma operação matemática de equivalências
entre palavras mediada pelo uso do dicionário, remonta à idéia de traição do provérbio
italiano “Tradutori traditori”³.
Qual, de fato, o douto e mesmo o indouto que, desde que tiver nas mãos um exemplar, depois de o haver percorrido apenas uma vez, vendo que se acha em desacordo com o que está habituado a ler, não se ponha imediatamente a clamar que eu sou um sacrílego, um falsário, porque terei tido a audácia de acrescentar, substituir, corrigir alguma coisa nos antigos livros? (Meclamitans esse sacrilegum qui audeam aliquid in verteribus libris addere, mutare, corrigere). Um duplo motivo me consola desta acusação.
O primeiro é que vós, que sois o soberano pontífice, me ordenais que o faça; o segundo é que a verdade não poderia existir em coisas que divergem, mesmo quando tivessem elas por si a aprovação dos maus". (Obras de São Jerônimo, edição dos Beneditinos, 1693, t. It. Col. 1425).
São Jerônimo, “o pai da Bíblia latina” (a vulgata²), chamado de santo padroeiro
dos tradutores, não recebeu o ilustre título por ter sido o primeiro, nos registros
históricos, a apresentar uma teoria da tradução, pois cabe a Platão tal honra. Seja talvez
porque Jerônimo foi o primeiro a reclamar das traduções e da sua qualidade, a criticar
copistas descuidados e a promover uma campanha em prol de maior exatidão. No
entanto, esse mesmo Jerônimo, em sua epístola ‘Os princípios da tradução’, afirma que,
com exceção das Escrituras Sagradas, “um tradutor não devia sentir-se obrigado a
produzir uma transcrição palavra por palavra; bastava traduzir o significado” (p. 437-
438).
Afirmações como essa e como a seguinte, promovem críticas à vulgata e à
Jerônimo, de que o mesmo teria adulterado o seu conteúdo na tradução do texto grego
para o latino.
Consoante às afirmações de Jerônimo, vemos que traduzir é mais do que
conhecer uma língua e seu vocabulário, ou, ainda, é mais do que transpor palavras de
uma língua à outra; traduzir é uma tarefa que requer reflexão consciente, mas é também
uma arte, um dom.
Em oposição, uma outra concepção, de que a tradução acontece num vácuo
temporal e cultural, onde uma ideia formulada numa língua pode ser automaticamente
transposta à outra língua como se tratasse de uma operação matemática de equivalências
entre palavras mediada pelo uso do dicionário, remonta à idéia de traição do provérbio
italiano “Tradutori traditori”³.
1. Parte do artigo TRADUÇÃO: Fidelidade versus Liberdade. Aline Ribeiro Pena. UESC
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